Veja a lista de modelos atuais que foram desenvolvidos aqui ou pensados para o nosso mercado

Por Fernando Miragaya

Não é só no futebol ou nas artes. A gente também tem muito daquele complexo de vira-lata – aquele que Nelson Rodrigues ressaltava – quando o assunto é automóvel. Tudo o que vem de fora acaba, geralmente, mais elogiado e alvo de menos desconfianças. Especialmente projetos europeus e norte-americanos. Mas o que não faltam são carros projetados no Brasil – alguns, inclusive, que ganharam o mundo.

Na história da indústria automobilística brasileira não faltam exemplos. Volkswagen SP2 e Brasília, Puma, Ford EcoSport, Fiat Palio Adventure, Chevrolet Corsa Sedan e Celta são só alguns exemplos recentes de sucesso, sem falar em marcas genuinamente nacionais, como Gurgel e Troller.

Claro que tiveram fracassos também, como VW Variant II, Chevrolet Agile e Peugeot Hoggar. Mas, em geral, os carros projetados no Brasil fazem sucesso e perduram por muitos anos. Confira os modelos que ainda estão em produção e foram pensados para cá.

Volkswagen Gol/Voyage

O caso mais bem sucedido de carros projetados no Brasil, o Gol nasceu para ser um veículo robusto e aguentar as condições das ruas brasileiras. Porém, tudo começou a partir de um pedido de Rudolf Leiding, presidente da filial brasileira da Volks e então chefão global do grupo nos anos 1970. O executivo, na verdade, havia “encomendado” um esportivo com motor do Passat, mas a Crise do Petróleo mudou os planos.

Em 1980 surgiu o primeiro Gol, primeiro exemplar do Projeto BX, que daria origem a uma linha completa de veículos nos anos subsequentes: Voyage, Parati e Saveiro. Detalhe é que o hatch foi desenvolvido com base em dois modelos europeus emblemáticos, o VW Scirocco e o Audi 80.

Outra curiosidade é que o Gol começou meio mal nas vendas, ainda mais para quem tinha a missão de substituir o Fusca. Como a VW não tinha volume de produção suficiente no Brasil para equipar o compacto com o motor refrigerado a água do Passat, adaptou o 1300 boxer a ar do besouro no cofre dianteiro do hatch.

Logo os primeiros Gol receberam o apelido de chaleira. Anos mais tarde veio o 1.6 ainda a ar, mas só em 1985 é que o modelo recebeu o motor AP 1600. Foi o carro mais vendido do país por 27 anos seguidos, ultrapassou a marca de 8,5 milhões de unidades produzidas e ainda figura aí, firme e forte, entre os 10 mais emplacados, após três gerações e quatro reestilizações.

Seu futuro, contudo, é um SUV. Entre 2023 e 2024, a Volks vai substituir a linha compacta por um crossover pequeno, outro carro projetado no Brasil, só que sobre a plataforma MQB. O nome Gol tem grandes chances de ser aposentado.

Renault Sandero

Em 2004, a Renault confirmou, no Salão de Paris daquele ano, que o quadradão e controverso Logan seria vendido no Brasil. Feito pela romena Dacia, era um sedã de baixo custo e com espaço de médio para brigar entre os compactos. Na mesma época, as engenharias da filial brasileira da marca e da montadora romena (que faz parte do grupo francês) começaram a desenvolver um hatch na mesma lógica.

Apesar de desenvolvido no Technocentre da Renault, próximo a Paris, o Sandero é um dos carros projetados no Brasil que continuam em produção. Ele foi lançado por aqui em dezembro de 2007, seis meses após o Logan, e dentro da mesma lógica e sobre a mesma plataforma B0: custo/benefício agressivo e maior espaço interno do que a média do segmento de compactos, a despeito de um desenho que estava longe de ser unanimidade.

Com o símbolo do losango na ponta do capô, o Sandero foi o primeiro Renault a ser lançado primeiro fora da Europa. Um fato curioso é que era posicionado acima do Logan, o que contrariava a lógica do mercado brasileiro. Ganhou inúmeros motores, câmbios, versões e séries especiais ao longo dos anos, e uma segunda geração a partir de 2014. É outro que tem data para mudar, entre 2023 e 2024.

Fiat Uno (segunda geração)

O Uno dos anos 1980 foi uma quebra de paradigmas para o setor automotivo brasileiro, e logo o modelo se tornou um dos três carros mais vendidos por aqui durante décadas. A ponto de inspirar a Fiat a desenvolver uma segunda geração do compacto apenas para o Brasil e mercados latino-americanos.

Essa segunda geração do Uno foi lançada em 2010 e pouco lembrava a botinha ortopédica que surgiu em 1984. Até manteve o desenho quadradinho, mas o conceito “Round Square” queria pegar carona na tendência de estilo de modelos como o Kia Soul, para atrair um público mais jovem.

Fabricado em Betim (MG) sobre a plataforma 327, o Uno atual estreou os motores 1.0 e 1.4 Fire Evo. Não tem o mesmo aproveitamento de espaço do modelo original, mas fez sucesso nos primeiros anos – quando conviveu com a primeira geração do compacto, rebatizada apenas como Mille.

Contudo, o carro projetado no Brasil já sente o peso da idade. Ficou defasado com a chegada de rivais mais modernos, caiu bastante nas vendas e já faz o rito de passagem. Recentemente, a gama foi reduzida a apenas uma versão, movimento característico de carro que sairá de linha, o que deve ocorrer em 2022.

Fiat Strada/Volkswagen Saveiro/Chevrolet Montana

Fica mais fácil reunir as picapes compactas em um mesmo tópico dos carros projetados no Brasil, até porque é um tipo de carroceria quase que “genuinamente” nacional. Esse segmento foi inventado aqui nos anos 1970 com o lançamento da Fiat 147 Pick-up, e logo seguido por várias marcas.

Até hoje as linhas compactas dos principais fabricantes têm seus representantes picapeiros, todos desenvolvidos em solo nacional. A Fiat Strada, líder do segmento por mais de duas décadas, é o maior exemplo. Foi desenvolvida a partir do primeiro Palio (1996) e sempre foi um fenômeno de vendas. Em 2020 ganhou uma segunda geração, agora tendo como base o Argo, e se mantém muito à frente dos concorrentes nos emplacamentos.

A VW Saveiro nasceu em 1983 e seguiu todas as gerações e reestilizações da família Gol, desde quando ainda era parte do Projeto BX. Já a Chevrolet Montana atual é derivada de outro carro projetado no Brasil, o Agile, com base do primeiro Corsa, de 1994 – a primeira geração era derivada do Corsa II, mais moderno.

O modelo foi lançado em 2010, com seu desenho bastante controverso, mas não conseguiu acompanhar os rivais de categoria. É outro que está no corredor da morte, em versão única, e sairá de cena para dar lugar a uma nova geração maior, que brigará no andar de cima com a Fiat Toro, ali na categoria de picapes intermediárias.

Chevrolet Onix e Onix Plus

Desde 2001 que a General Motors no Brasil resolveu investir em uma linha compacta de carros projetados no Brasil. Começou com o Chevrolet Celta, em 2001, que usava plataforma do primeiro Corsa. Depois, veio o Onix, que hoje está em sua segunda geração e foi o automóvel mais vendido do país nos últimos sete anos.

O modelo foi idealizado no fim dos anos 2010. Depois da má-recepção ao Agile, a GM daqui resolveu interromper o Projeto Viva, que previa, além do controverso hatch, um sedã, um monovolume, uma picape e um SUV (só a picape Montana foi levada adiante). E foi buscar em projetos asiáticos soluções mais viáveis para operar no Brasil do que os carros da alemã Opel.

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Em 2012, o Onix veio na leva de renovação de toda a linha da Chevrolet no país. A primeira geração do modelo deu origem a um novo Prisma (sedã) e usava a plataforma GSV (Global Small Vehicles), de origem sul-coreana e compartilhada com modelos como Cobalt, Spin e a geração passada do Tracker.

O fabricante não dormiu no ponto nem subiu no salto com a liderança. O novo Onix chegou em setembro de 2019, sobre outra arquitetura, a GEM (Global Emerging Markets), esta desenvolvida em parceria com a chinesa SAIC. O modelo, e seu sedã Onix Plus, só não lideram o mercado no momento por causa das paralisações da produção em Gravataí (RS) devido à falta de insumos. As atividades só foram retomadas recentemente.

Hyundai HB20 e HB20S

A Hyundai desde o início dos anos 2000 é representada pelo Grupo Caoa, que transformou a marca por aqui. Mas, no fim dos anos 2010, os sul-coreanos resolveram fincar raízes em solo nacional, de olho no crescente mercado brasileiro de automóveis. E com um carro projetado para o Brasil, mais especificamente uma linha compacta. Nascia o HB20.

A ideia era fazer uma espécie de “Gol sul-coreano”. Um modelo robusto, mas com acerto de suspensão mais macio, design diferenciado e acabamento mais caprichado. O HB20 foi desenvolvido na Coreia do Sul em parceria com engenheiros brasileiros, enquanto a fábrica de Piracicaba (SP) começava a ser construída.

O modelo ganhou uma plataforma inédita, que depois serviu ao novo i20 europeu. Mas o acerto e desenho dos carros foram exclusivos para o Brasil. E o foco de disputar o topo de vendas no mercado era tão evidente que um grupo de jornalistas que dirigiu os primeiros pré-séries do compacto na Coreia do Sul eram questionados constantemente em comparações com o Gol e o Palio, os então líderes de mercado.

O HB20 foi lançado em 2012 e acabou sendo uma espécie de quebra de paradigmas dentro da categoria de compactos – algo como foi o Peugeot 206 lá nos anos 2000. Tinha design arrojado e fora do previsível do segmento, bom acabamento, desempenho robusto, mas um acerto de suspensão mais macio – para ficar no meio-termo entre o VW e o Fiat.

Logo começou a figurar entre os três mais vendidos do país e ganhou uma segunda geração em 2019, quase que simultaneamente com seu principal rival, o Onix.

Fiat Toro

Ela não inaugurou o segmento por questões de meses. Mas, sem dúvida, entendeu melhor a categoria que sequer existia seis anos atrás. Com um desenho fora do lugar-comum do segmento, porte das antigas médias, além de maiores espaço e capacidade de carga do que as compactas, a Toro foi um dos carros projetados no Brasil pela Fiat mais certeiros dos últimos tempos.

Desde o lançamento, em 2016, é um sucesso de vendas. O estilo arrojado e o tamanho da picape médio-compacta atraiu um público bem diverso. Tanto para quem queria um veículo robusto ou desfilar de picapeiro urbano, como para quem precisava conciliar o veículo para o trabalho e o lazer.

A solução, em termos de arquitetura, veio de elementos do Jeep Renegade. Feita sobre monobloco e com capacidade de carga de até uma tonelada, oferece conforto e versatilidade, que se espelha nas variadas opções. O modelo é negociado com o velho motor 1.8, mas também se vale de um novo turboflex (lançado junto com o face lift deste ano) e um robusto 2.0 turbodiesel.

A Toro já ganhou até mercados latinos sob uma marca genuinamente picapeira do Grupo Stellantis (ex-FCA). Em países como o México, é vendida como RAM 1000.

Volkswagen Fox

No fim dos anos 1990 a Volkswagen resolveu ousar e fazer o Polo europeu nos nossos domínios, Mas sabia que precisava fechar a conta para justificar tamanho investimento em um carro que ficaria bem acima do Gol. A solução veio na forma de outro carro projetado no Brasil, o Fox.

A ideia era fazer o compacto sobre uma arquitetura simplificada do Polo, que foi lançado em 2001. Um ano depois era a vez de o Fox ser apresentado como uma alternativa um pouco mais espaçosa e equipada ao Gol. A proposta de hatch “altinho”, inclusive, foi seguida por outras marcas nos anos posteriores, quando chegaram o Renault Sandero e o Chevrolet Agile.

O Fox teve versão aventureira (CrossFox) e ainda deu origem à station-wagion SpaceFox, esta produzida na Argentina até 2019. Chegou a ser exportado para mercados europeus, para ser o carro de entrada da marca, e também para o México, onde era comercializado como Lupo – para evitar comparações com o ex-presidente do país, Vicent Fox.

O hatch, contudo, segue firme e forte no Brasil em apenas duas versões de acabamento e sempre com motor 1.6 de 104/101 cv. Seu custo/benefício agressivo é o que justifica ainda estar em linha – é um dos carros mais antigos em produção no país. Mas deve sair de cena nos próximos anos com a proximidade do novo Projeto 246 da VW.

Chevrolet Spin

Nos anos 2000, as minivans da GM arrebataram uma legião de fãs – em especial, taxistas e frotistas. Eram a Meriva e a Zafira, com suas cabines bem aproveitadas e opção de sete lugares – a compacta, inclusive, oferecia uma modularidade de bancos fantástica. Porém, o fabricante precisava renovar a linha e resolveu criar um monovolume para substituir os dois carros de uma vez só.

Surgiu, desta forma, a Spin, em 2012. Com desenho para lá de controverso, foi tocado pelo Centro de Desenvolvimento da GM em São Caetano do Sul, no ABC Paulista (um dos cinco centros do grupo no mundo) e ficou no meio-termo entre a Meriva e a Zafira, com direito à versão de sete lugares. A Chevrolet até chegou a ter a audácia de chamá-la de SUV no lançamento, mas é mesmo uma minivan feita sobre a plataforma GSV do primeiro Onix.

É a única minivan brasileira que ainda sobrevive no mercado (a Fiat Doblò é uma multivan, ou mini-furgão), e ainda faz a cabeça de muitos taxistas – apesar destes não se cansarem de lamentar o fim da dupla Meriva/Zafira. Porém, deve ser a única e última. A nova geração da Spin será um crossover de mesmo porte, que terá opção de assentos extras.

Fiat Mobi

Outro carro projetado no Brasil para aproveitar a plataforma e reduzir custos na escala de produção. Lançado em 2016, o Mobi é um subcompacto que usa a base do Uno e foi desenvolvido para ser a porta de entrada da marca italiana no Brasil. Com o colega de arquitetura, compartilha boa parte da mecânica e também o motor Fire.

O carrinho, porém, demorou a engrenar. Além de ser bem menor, havia a expectativa que ele estreasse, em 2016, os novos motores Firefly – função que coube ao Argo, em 2017. Além disso, a Fiat tardou um pouco em mexer na linha compacta: Palio e Pinto ainda foram fabricados até 2017 e o Uno tinha versões de entrada que roubavam potenciais clientes do Mobi.

Hoje, na loucura de preços e de produções paralisadas no país, o Mobi está entre os carros mais baratos do país. E nos primeiros sete meses do ano, figura como o quarto automóvel mais vendido do país, segundo os dados de emplacamentos da Fenabrave.

Volkswagen Nivus

Um dos mais recentes carros projetados no Brasil é o Nivus. Inspirado no conceito New Urban, o modelo é o primeiro da marca alemã a adotar o estilo SUV-cupê. Foi lançado em 2020, em meio à pandemia do novo coronavírus, para ser uma alternativa de crossover mais urbano que o T-Cross. Tanto que tem porta-malas tem maior capacidade que o irmão “mais jipão”.

O Nivus foi desenvolvido em São Bernardo do Campo (SP), usa a plataforma modular MQB e tem como base o Polo – o T-Cross usa a base do Virtus. Desde a estreia, mantém apenas duas versões de acabamento e o mesmo conjunto mecânico: o motor 1.0 TSI turbo de 128/116 cv aliado ao câmbio automático de quatro marchas. O modelo ganhará as ruas europeias em breve: será feito na Espanha e vendido no continente como Taigo.

Renault Oroch

Houve um tempo em que a Renault planejou fazer uma picape compacta em cima do Logan. Era fim dos anos 2000, mas o projeto foi interrompido depois de a marca testemunhar o desastre que foi a Peugeot Hoggar. Só que a ideia de fazer da primeira picape do fabricante um carro projetado no Brasil continuou na pauta de São José dos Pinhais (PR).

A solução veio em fazer um comercial leve a partir do Duster. A Oroch, então, nasceu em 2016 e foi a precursora do segmento de médio-compactos. Não faz nem sombra nas vendas da Fiat Toro, muito por conta do desenho quadradão e controverso. Hoje, é uma compra muito mais racional na categoria.

Mesmo assim, mudará no ano que vem. Ganhará retoques visuais na dianteira e opção de motor turboflex.

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