[Nostalgia] Uma volta no Fiat 147 (cachacinha) movido a álcool

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Quarenta anos depois de sua chegada nossa reportagem andou num dos primeiros 147 movido a álcool. O hatch foi o primeiro modelo produzido em série no mundo apto a usar o combustível

Habilitado desde 1998, o primeiro carro que dirigi depois de tirar habilitação foi um Fiat 147 de um amigo. O bichinho estava judiado e castigado pelo tempo e também pela falta de cuidado dos donos anteriores. Treinado em modelos mais novos na autoescola, a experiência na época não foi das melhores. A dificuldade em manter o 147 em linha reta foi grande e engatar as marchas então, nem se fale.

Fiat 147 álcool
Foto | Marlos Ney Vidal/Autos Segredos

21 anos

Vinte um anos depois, estou novamente ao volante de um Fiat 147. Porém, mais experiente e apto a rodar em carros antigos. Afinal, tornei-me jornalista automotivo e os carros que uso quando não estou dirigindo um lançamento são um Fusca 1978 ou uma Kombi 1996. Fui convidado pela Fiat para dirigir um dos primeiros exemplares do 147 movido a álcool fabricado em série no mundo.

Fiat 147 1978
Foto | Pedro Cerqueira

147 1978

Antes de guiar o modelo 1979 a álcool, como aperitivo, andei num Fiat 147 1978/1979, na cor branca, todo restaurado pela marca. Ao girar a chave no contato, coração do bichinho começa a bater e som característico do escape começa a ser ouvido. Engatei a primeira marcha e parti para uma volta na pista de testes da Fiat, em Betim (MG).

Restaurado, mas, mantendo suas condições originais de quando foi lançado, o exemplar, tem rodar firme. Levando-se em consideração que é um carro produzido em 1978, o desempenho do motor 1050 surpreendeu. Levando quatro adultos, o 147 teve fôlego até para dar uma “abusada” no pé direito.

Fiat 147 álcool
Foto | Marlos Ney Vidal/Autos Segredos

147 a álcool

O outro exemplar das fotos que ilustram essa matéria pertence ao Ministério da Fazenda e está aos cuidados da Fiat. O modelo não foi restaurado e apenas recebeu manutenções para ficar em condições de uso.

Fiat 147 álcool
Foto | Marlos Ney Vidal/Autos Segredos

Na cor preta, com faixas brancas e as letras MF estampadas em sua carroceria, o 147 mantém sua pintura original, inclusive com suas marcas de uso. O exemplar teve a sorte de ficar na labuta em Brasília (DF) e as condições climáticas da capital do país ajudaram em sua conservação.

Fiat 147 álcool
Foto | Marlos Ney Vidal/Autos Segredos

O 147 é um veículo inalienável como está escrito numa placa pregada em seu painel. A identificação ainda afirma: “Trata-se do primeiro veículo produzido em série com motor movido a álcool hidratado. Por ocasião de sua baixa de serviço, deverá ser recolhido ao Museu da Fazenda Federal”. Placa FO0292

Robson Cotta
Foto | Marlos Ney Vidal/Autos Segredos – Robson Cotta mostra manual de época para mostrar as diferenças do 147 álcool

O engenheiro Robson Cotta foi o responsável por sua recuperação e também para encontrar peças para deixar o 147 a álcool apto a rodar. Ele conta que chegou a ir até o encontro de Águas de Lindoia atrás de peças para o 147 “cachacinha”. Robson é um dos grandes entusiastas da indústria automotiva do Brasil e a história da Fiat no Brasil está diretamente ligada a ele.

Fiat 147 álcool
Foto | Marlos Ney Vidal/Autos Segredos

Tampa vermelha

Ao abrir o capô, a tampa de válvulas na cor vermelha entrega a aptidão pelo álcool. A peça está desgastada como se espera ver num modelo com 40 anos de uso. Tirando algumas tampas novas, todos os demais componentes e cofre do motor estão com as marcas de quem já trabalhou muito.

Fiat 147 álcool
Foto | Marlos Ney Vidal/Autos Segredos

Interior

O interior do 147 álcool está do mesmo jeito de quando o modelo estava na ativa. As forrações dos bancos e das portas carregam as marcas dos tempos que andava com a equipe do ministério.

Fiat 147 álcool
Foto | Marlos Ney Vidal/Autos Segredos

Andando

Se o desempenho do 147 1050 já foi interessante, o 147 1300 a álcool surpreendeu, para um veículo de 40 anos. Ao lado do Robson, dei a partida e o cheiro de álcool tomou conta do local.

Fiat 147 álcool
Foto | Marlos Ney Vidal/Autos Segredos

Engatei a primeira e sai com todo cuidado, afinal, estava dirigindo uma relíquia que faz parte da história do automóvel brasileiro.

Já na pista, fiquei mais solto e com o aval do Robson, acelerei mais forte o cachacinha. O motor 1300 embala rapidamente e logo já estou com a quarta marcha engatada. Na reta da pista dou aquela esticada e o 147 segue todo serelepe. Ao reduzir para entrar na curva, piso no freio e reduzo para a terceira e o hatch a contorna sem susto. O câmbio de quatro marchas trabalha bem com motor 1.3, os engates não são tão precisos, mas, uma pisada mais funda no pedal embreagem ajuda. O câmbio tem engates curtos.

Bom torque

O motor 1300 a álcool foi desenvolvido a partir do 1300 que se mostrou mais apto a usar o álcool. A potência era apenas de 1 cv a mais que o similar movido a gasolina, ficando com potência final de 62 cv. Já o torque considerando a potência do motor era alto e chegava a 11,5 kgfm, isso explica as boas retomadas na pista durante nossas voltas.

Mudanças

Entre as alterações do motor para beber álcool, estão a taxa de compressão que foi elevada de 7,5:1 na gasolina para 11,2:1 com álcool. A carburação também recebeu modificações para que a mistura ar/combustível ficasse mais rica com maior percentual de combustível. Por fim, o motor teve que receber um sistema de partida a frio.

Fiat 147 álcool
Foto | Marlos Ney Vidal/Autos Segredos

Direção

Comum nos dias de hoje, a direção do 147 não tem nenhum tipo de assistência. É uma relação mais direta com o carro, os pneus de aro 13 e o baixo peso do modelo contribuem para deixá-la mais leve.

Suspensão

A suspensão do 147 é independente nas quatro rodas e considerando a idade do projeto ela cumpre bem seu papel. Por erro de um amigo, acabamos por passar numa pista de testes de ruído e ela suportou bem o piso. As batidas são secas, mas, aceitáveis.

Apelido

Não há confirmação oficial, mas, os executivos da Fiat dizem que o apelido de cachacinha do 147 surgiu em seu desenvolvimento. Sem combustível à venda, a marca levava galões de álcool para os testes de rodagem, quando o estoque acabava, chegaram a comprar a cachaça nas tradicionais vendas do interior e abasteciam o 147 com a bebida alcoólica.

Solução

O 147 a álcool foi estimulado pelo Programa governamental “Pró-álcool” criado por um Decreto Governamental em 14 de novembro de 1975. A Fiat comprou a ideia e em 1976 começou a desenvolver o motor a álcool. A marca chegou a rodar mais de 1 milhão de quilômetros em testes com o 147. Até mesmo a equipe do DNER ajudou no desenvolvimento do modelo. Prestando serviço ao departamento, o cachacinha rodou 4.660 quilômetros indo do Rio de Janeiro a Rondonópolis.

Fiat 147 álcool
Foto | Marlos Ney Vidal/Autos Segredos

A chegada do motor a álcool foi uma solução para os altos preços praticados pela gasolina que chegavam quase ao dobro do derivado da cana.

Histórico

Em 1980, o percentual de carros movidos a álcool era de 27%; em 1982, a participação pulou para 28,9%. O ápice foi em 1985, quando a frota de modelos impulsionados pelo combustível chegou a 95,8%. Em 1987, a participação ficou em 93,6%.

Vendas do 147 álcool

De 1979 a 1987, Fiat 147 movido a álcool teve 120.516 unidades vendidas no Brasil.

Ficha técnica Fiat 147 1.3 Álcool

CARROCERIA E CHASSI
Carroceria de chapa de aço estampado, tipo hatch, três portas e cinco lugares, estrutura monobloco diferenciada.

MOTOR
Dianteiro transversal, quatro cilindros verticais em linha, bloco em ferro fundido, árvore de comando de válvulas no cabeçote acionada por correia dentada, alimentação por carburador monocorpo de fluxo descendente, refrigeração a água com ventilador elétrico. Diâmetro e curso dos pistões: 71,5 x 76 mm; cilindrada total: 1.297,5 cm3; taxa de compressão: 11,2:1; potência: 70 CV/51,5 kW (SAE) a 5.600 rpm; torque: 11,5 mkgf/111,6 Nm (SAE) a 3.000 rpm; etanol.

TRANSMISSÃO
Tração dianteira, embreagem monodisco a seco de acionamento mecânico, caixa de câmbio mecânica de quatro marchas sincronizadas à frente e uma à ré, com alavanca de mudanças no assoalho. Relações de câmbio: 1ª) 4,091; 2ª) 2,235; 3ª) 1,454; 4ª) 0,959; ré) 3,714; relação do diferencial: 4,077.

SUSPENSÕES
Dianteira – Independente, com braços oscilantes e montantes fixados a amortecedores telescópicos hidráulicos, molas helicoidais e barra estabilizadora. Traseira – Independente, com braços oscilantes inferiores e amortecedores telescópicos hidráulicos, feixe de molas transversal tipo semielíptico de três lâminas, que funciona também como estabilizador.

FREIOS
Freio de serviço de acionamento hidráulico, circuitos independentes, discos na frente e tambores autocentrantes atrás, com regulador de frenagem agindo sobre o circuito traseiro conforme a carga do veículo.

DIREÇÃO
Mecânica, de pinhão e cremalheria, com 3,4 voltas de batente a batente; diâmetro de giro mínimo de 9,1 metros.

RODAS E PNEUS
Rodas de aço estampado, com aro de 13 polegadas e tala de 4 polegadas. Pneus radiais 145-80SR-13.

SISTEMA ELÉTRICO
Bateria de 12V e 36 Amp/h; alternador de 35 Amp.

DIMENSÕES
Distância entre-eixos: 2.225 mm; bitola dianteira: 1.270 mm; bitola traseira: 1.289 mm; comprimento: 3.627 mm; largura: 1.545 mm; altura: 1.350 mm; distância máxima do solo: 140 mm.

CAPACIDADES
Tanque de combustível: 38 litros; porta-malas: 365 litros.

PESOS
Peso líquido em ordem de marcha: 790 quilos.

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