Por Marlos Ney Vidal e Renato Passos

Quando se pensa em economia de combustível, muitos irão imaginar que o motor é o maior responsável. Entretanto, outros recursos são responsáveis por grande parte da economia. Uma simples troca de pneumáticos por outros de baixa rolagem pode representar uma economia de até 3%, por exemplo.

“É um trabalho de formiguinha”, diz Sandro Soares, Gerente de Engenharia do Produto da Fiat Chrysler Automobiles (FCA). “Não adianta uma área trabalhar isolada e chegar a uma economia de 4% com o uso de uma nova peça ou tecnologia. Como todos os sistemas do carro trabalham em conjunto, tem que se observar qual será o gasto de outros componentes para ver se a conta fecha” completa. Soares também explica que sempre tem que se observar a balança. “Se, para chegar aos 2% de economia, o sistema que trabalha em conjunto for gastar 3%, (o processo) será descartado”, ressalta.

Qualquer ganho, por menor que seja, deve ser comemorado. Um dos bons exemplos da Fiat é o Uno 2017 que, com a chegada dos motores 1.0 e 1.3 Firefly, passou por diversas melhorias para ficar mais eficientes energeticamente. No caso do Uno Way 1.3, o trabalho final de uso de novos recursos tecnológicos representou 9,5% do total de 16,7% da otimização energética. O motor 1.3 e o óleo geraram uma redução de 7,2%.


Fiat

O “trabalho de formiguinha” rendeu muito no Uno 2017. Entre as mudanças perceptíveis para o consumidor estão a nova grade, o novo motor e a direção elétrica. Porém, o trabalho envolveu recursos que o cliente nem imagina.

Um dos artifícios usados no compacto é o sistema Smart Charger – que carrega a bateria somente em condições ideais. Em relação ao alternador convencional, o Smart Charger consome 75% menos de carga. Com a mudança, houve melhora de 1,2% na eficiência energética.

Nos sistemas aplicados aos carros convencionais, o alternador sempre exerce trabalho de geração de corrente elétrica, convertendo potência mecânica – esta, por sua vez, é transmitida pela correia de acessórios, transformando-a em energia elétrica.

Já com o Smart Charger, a geração de energia se dá sob demanda de acordo com a necessidade do automóvel e o nível de carga da bateria. Logo, quando não se faz necessária a recarga do sistema elétrico, a polia motora do componente gira em falso, reduzindo assim o consumo de energia mecânica do motopropulsor.

A substituição da direção com assistência hidráulica por uma elétrica representou uma melhoria de 1% na eficiência energética. Assim como no alternador sob demanda, a assistência por motor elétrico no sistema de direção só ocorre quando o condutor aciona o volante para uma mudança de trajetória, ao contrário do sistema de auxílio hidráulico em que o trabalho de bombeamento de óleo do sistema dedicado é constante – e, novamente, consome mais energia do motor.

Outras mudanças imperceptíveis ao consumidor são as aerodinâmicas. O Uno 2017, por exemplo, recebeu novo spoiler dianteiro (DAM), convergedor de ar do radiador e revestimentos aerodinâmicos no assoalho. No final, as mudanças geraram uma melhoria de 0,8% na eficiência energética.

As fábricas usam softwares para o refinamento aerodinâmico dos automóveis. Segundo Sandro Soares, da FCA, o trabalho se dá a partir de várias iterações da engenharia de aerodinâmica com a área de Centro Estilo / Engenharia Body. O modelo virtual gerado é analisado pelas áreas buscando os objetivos do projeto e otimização das performances aerodinâmica (aeroacústica/aerothermal/consumo de combustível) e ergonômica, design, factibilidade de manufatura (funilaria e partes plásticas) e resistência estrutural do Body.

“A atividade de otimização aerodinâmica virtual parte de uma análise de pelo menos duas opções oriundas da área Centro Estilo, para que se aponte a forma externa de menor resistência com o ar. Além disso, o resultado é confrontado com uma tendência de mercado para o segmento desse modelo novo e necessidade de redução de consumo de combustível para o novo modelo. Para otimizar coeficiente aerodinâmico e área frontal são feitas sugestões técnicas aerodinâmicas aos designers, a partir de estudos virtuais aplicando dinâmica dos fluidos computacional e ferramentas de estudo estatístico que apontam as mais adequadas práticas e recursos aerodinâmicos para aquela forma externa  (hatch/ sedã/ SUV, etc.)”, afirma o Gerente de Engenharia do Produto da FCA.

Na corrida pela melhor eficiência energética, os pneus são importantes aliados. No caso do Uno 2017, os pneus verdes renderam uma melhoria de 1,1% por conta da menor resistência do rolamento, menor atrito com o solo e deformação reduzida.

Os pneus super verdes foram responsáveis pela melhora de 1,1% na eficiência energética do Uno 2017

Os pneumáticos em questão possuem elevado nível de sílica, o que os torna mais “duros” para o usuário comum em termos de sensibilidade. Entretanto, essa dureza extra reflete na menor dissipação energética pela deformação do componente, em um efeito conhecido como histerese.

Em qualquer componente, a aplicação de uma força gera uma deformação, por mínima que seja. A terceira lei de Newton – conhecida como lei da ação e reação – diz que “a toda ação há sempre uma reação oposta e de igual intensidade: as ações mútuas de dois corpos um sobre o outro são sempre iguais e dirigidas em sentidos opostos”.

Se um elemento externo aplica um esforço sobre o pneumático, este último retribuirá a força em sentido oposto mas com a mesma intensidade. Ao menos na teoria: na prática, a “devolução” da força pode ser mais fraca, dada características de absorção de energia dos corpos – eis aí a histerese.

Por fim, o novo eletro-ventilador e a bomba com modulação por largura de pulso (MLP) renderam um 1% de eficiência energética. Em percurso urbano, a bomba com MLP consome menos de 50% de carga. Já o eletro-ventilador sem escovas com controle MLP consome 90% menos de carga que um eletro-ventilador convencional.

“A redução de consumo de combustível do veículo equipado com eletroventilador Brushless é proporcionada pela melhor gestão térmica do motor com um menor consumo de corrente, o Brushless permite manter a temperatura do líquido de arrefecimento mais constante com uma carga consumida até 90% inferior a consumida pelo eletro com resistor em situações uso do veículo de demanda de arrefecimento menores”, diz Sandro Soares, Gerente de Engenharia do Produto da FCA.

Chevrolet

Para deixar seus modelos com maior eficiência energética a Chevrolet lançou mão do pacote ECO que consiste em várias alterações no modelo além do conjunto motor/transmissão. A dupla Onix e Prisma Joy e a Spin são bons exemplos de como o uso de novas tecnologias deixaram os modelos mais econômicos. O Onix Joy está 31 quilos mais leve e até 14% mais eficiente energicamente. Já o Prisma ficou até 16% mais eficiente energeticamente e 25 quilos mais leve. A Spin teve 100 peças da carroceria retrabalhadas.

Direção elétrica foi um dos recursos do pacote ECO para deixar Onix e Prisma com melhor eficiência energética

Entre as alterações do Onix Joy estão à redução de altura em 10 mm, pneus verdes, ajustes na suspensão, direção elétrica e uso de materiais nobres para a redução de peso.

A redução de altura busca um aprimoramento aerodinâmico. Sabe-se que é possível obter um menor coeficiente aerodinâmico através de uma menor altura de rodagem – no começo dos anos 1990, tanto o Chevrolet Kadett quanto o Fiat Tempra apresentavam índices aerodinâmicos piores que seus semelhantes europeus dada a maior altura em relação ao solo dos veículos nacionais.

Isso ocorre, basicamente, graças a dois fatores combinados: a área frontal corrigida do veículo – que interfere na resistência exercida pelo ar no veículo em movimento – se torna menor, ao passo que o escoamento do fluido por debaixo do automóvel pode se tornar menos turbulento e mais amigável ao desempenho.

É uma analogia simples de ser feita: você já experimentou abrir a janela do veículo e colocar a mão aberta para fora? Refaça a operação com os dedos da mão fechados e apontado para a frente e veja o quão menor é a força exercida pelo ar no braço da “cobaia”.

Em termos numerários, o Prisma 2017 apresenta uma melhora de 8% nos índices aerodinâmicos frente ao modelo anterior graças a esse recurso combinado a outros implementos que auxiliam na melhora do desempenho do automóvel nesse aspecto.

A física também se faz presente na economia de peso. Uma das mais famosas equações da física moderna indica que a força é o resultado da massa pela aceleração medida. Ou seja:

F ⃗=m x a ⃗

Desta forma, para uma aceleração mantida constante, uma menor massa demanda menor força para ser movimentada. Transportando para o alívio de peso notado nos pequenos da Chevrolet, temos que o motor exerce um trabalho menor para movimentar o automóvel. Daí, obtemos uma sensível redução no consumo de combustível.

A dupla Onix e Prisma Joy ganharam novo módulo eletrônico que é responsável por controlar diversas funções do motor. O componente está 40% mais rápido e potente, fazendo com que a central de comando lide mais rápido e de forma mais racional com a demanda de combustível do motor . Ainda fazem parte do pacote novos sistemas de arrefecimento e de gerenciamento de cargas elétricas.

Já a Spin passou por várias melhorias para se tornar mais econômica além da atualização do motor 1.8. O câmbio de cinco velocidades foi trocado por uma transmissão manual de seis marchas e o câmbio automática de nova geração com calibração para maior eficiência energética e desempenho (Até 0,6 segundo mais rápido nas acelerações de 0 a 100 km/h).

Ainda fazem parte do pacote a direção elétrica, pneus verdes com novos compostos e nova construção interna e baixa resistência à rolagem.

A suspensão recebeu nova calibração: molas, amortecedores, batente, nova barra estabilizadora, menor oscilação e mais conforto em pisos irregulares e centro gravitacional cerca de 10 mm mais baixo. Assim, alia-se um ganho aerodinâmico com uma dirigibilidade apurada.

Já os freios de baixo arrasto têm menor quantidade de componentes, montagem simplificada, menos folgas no sistema e mais leve e eficiente

Na parte eletrônica, a Spin 2017 ganhou novo sistema de gerenciamento das cargas elétricas – monitoramento contínuo da bateria, utilização otimizada do alternador, novo alternador de alto rendimento, consumo de energia do motor minimizado e garantia de operação eficiente do sistema.

No quesito aerodinâmico a Spin recebeu defletores nas rodas e no eixo traseiro, carroceria 10 mm mais baixa, cobertura da bandeja do estepe, air dam dianteiro e a grade ativa do radiador – embora um efeito passivo era obtido na grade do Ford Corcel II em 1978, consoante a velocidade do automóvel. O fechamento ativo reduz o arrasto aerodinâmico, retém calor no compartimento do motor em ocasiões de partida fria, melhor desempenho do veículo, velocidade máxima e aceleração e menor consumo de combustível.

Renault

A Renault também usa em todos os seus carros peças desenvolvidas visando a redução do coeficiente aerodinâmico . Segundo Fabien Venchiarutti, engenheiro da Renault, no caso do recém-lançado Captur, há spoilers abaixo do para-choque dianteiro e próximos à caixa de rodas traseira. A grade do SUV também é otimizada para melhor escoamento do ar. Ainda de acordo com o engenheiro até as rodas do SUV têm desenho para reduzir o arrasto.

Para reduzir o coeficiente aerodinâmico, o Renault Captur recebeu spoilers abaixo do para-choque dianteiro e próximos à caixa de rodas traseira

Necessário ressaltar que toda e qualquer reentrância na superfície da carroceria ou mesmo os vãos entre as chapas interferem no desempenho aerodinâmico do automóvel. Assim, graças à crescente utilização dos softwares – muitos deles baseados em fluidodinâmica computacional, ou CFD em inglês – os mínimos arremates nos carros são estudados para a otimização (ou menor interferência) da resistência do ar durante o movimento.

O sistema Stop&Start que hoje equipa Sandero e Logan com o novo motor 1.6 SCe foi um grande aliado na melhoria de eficiência energética do modelo. O sistema reduz até 5% o consumo de combustível. Pode ser desligado por meio de um botão, caso o cliente prefira.

Já o sistema ESM (Energy Smart Management) de regeneração de energia é uma tecnologia da Fórmula 1 que agora ganha as ruas. O sistema presente nos motores 1.0, 1.6 e 2.0 contam contribui para reduzir o consumo em até 2%. O ESM funciona a partir da gestão da energia da bateria com pilotagem do alternador (mesmo princípio da tecnologia KERS da F1), semelhante ao sistema de gestão energética aplicado pela Fiat.

Outro recurso usado pelo fabricante francês na corrida pelo melhor rendimento energético foi a substituição da direção hidráulica por uma montagem com assistência eletro-hidráulica. Segundo Venchiarutti, o novo componente pode reduzir em até 2% o consumo . Neste sistema o fluxo de óleo é gerenciado por uma bomba elétrica, que atua de forma independente em relação à velocidade do motor. Quando a assistência não é necessária, a bomba elétrica é desativada temporariamente.

Entre as melhorias que a dupla Logan e Sandero receberam também está a bomba de óleo variável. A tecnologia também surgiu nas pistas e agora ganha as ruas em carros ‘comuns’. “Esse sistema ajusta automaticamente o fluxo de óleo enviado de acordo com a rotação e a carga do motor. Como resultado, o motor absorve menos energia e, consequentemente, fica mais econômico”, afirma o engenheiro da Renault.

Nissan

A parceira de negócios da Renault também embarcou na busca por menor peso e, consequentemente, consumo mais apropriado para os dias atuais. Sentra, Kicks e a recém-lançada Frontier de nova geração empregam, na construção da carroceria, aço de alta resistência à tensão (do inglês High Strength Steel, ou HSS). Com o emprego desse material, é possível a construção de uma carroceria mais leve sem afetar a segurança em caso de impactos e a dinâmica veicular como um todo.

Nissan usa aço de alta resistência à tensão (High Strength Steel) para deixar seus modelos mais leves

Nenhum automóvel é rígido de forma inflexível. Se os automóveis são cada dia mais rígidos para melhor desempenho dinâmico e absorção de esforços em caso de impactos, não é possível a simples retirada de componentes estruturais sob pena de perder os avanços nos campos acima relatados. Daí a necessidade de se empregar ligas metálicas modernas – aplicando cromo, cobalto e outros componentes químicos –  que consigam aliar baixa massa e resistência mecânica nos parâmetros exigidos pelo consumidor.

O HSS utilizado pela fabricante nipônica possui alta resistência às tensões aplicadas – 1,2 Gigapascal (GPa), para ser mais exato – e boa capacidade de moldagem. O material também apresenta um alto índice de elasticidade e maiores resistência e maleabilidade. Esses atributos permitem que ele seja utilizado na produção de componentes com formatos complexos, algo difícil de ser realizado até então com os processos de estamparia tradicionais.

Volkswagen

A despeito de ser um produto com alguns anos de mercado, os melhoramentos realizados pelo fabricante no veterano Fox são um claro exemplo de como as medidas para se obter um carro mais econômico não dependem apenas de um motor diferenciado. Na versão BlueMotion, que busca maior eficiência energética, os esforços para melhor consumo não se resumem à adoção do eficiente motor EA211 1.0, com três cilindros e construção de vanguarda.

De acordo com a Volkswagen, o modelo teve uma redução de consumo energético (MJ/km) de 17% com etanol em relação ao modelo anterior de série. Deste percentual, apenas 7,4% são referentes à adoção do novo propulsor, cabendo às alterações restantes o protagonismo pelo apetite mais moderado do compacto alemão.

Aos olhos do observador comum, as maiores modificações estão no campo da aerodinâmica. Grades frontais específicas da versão, defletor de ar na tampa traseira e na caixa de roda traseira levaram a uma melhora dos índices de escoamento de fluido: o Coeficiente de forma (Cx) reduziu de 0,353 para 0,330, além de menor área frontal (de 2,170 para 2,160).

Na suspensão e sistemas vizinhos, o fabricante também aplicou uma série de melhorias e novos recursos técnicos. Adotou-se uma nova calibração de amortecedores específica e molas visando o uso de pneus de baixa resistência ao rolamento – intervenções semelhantes às aplicadas pela Chevrolet no Onix.

Assistência elétrica do sistema de direção também foi adotada, sendo somente ela a responsável pela redução de 3% de consumo em relação ao sistema de assistência hidráulica. Com a adoção desses novos componentes, o Fox BlueMotion é 29kg mais leve do que seu semelhante sem o pacote de maior eficiência energética.

Infografias de Fabiano Barroso/Auto Papo
Fotos | Fiat/Divulgação, Renault/Divulgação e Nissan/Divulgação

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